Bom dia, mercado

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7 de March de 2017

Bom dia, mercado

PUBLISHNEWS, LUIZ MACHANOSCKI - JESUS*, 07/03/2017

Luiz Machanoscki faz um desabafo e defende de forma poética o ofício dos livreiros

Gostaria de agradecer, primeira e grandiosamente, à Livraria Saraiva por minha incursão no mundo livreiro. Era um jovem aquecido pelas novidades tecnológicas, afoito por uma resposta da vida adulta e andarilho dos livros. Fiquei com medo sincero de que a aprovação de ser um vendedor de livros poderia me privar de ter minha característica efusiva, com a cabeça cheia de cabelo e protuberantes pelos na face. Fui aceito e… surpresa! – me disseram “Isso é bom”.

A desconfiança era que minha personalidade, posta visualmente, não seria bem vista em um ambiente profissional. Mas aos poucos vi, da maneira mais bonita, algumas certezas quanto ao ser humano serem colocadas em práticas diárias de aprendizado e conquista. A técnica do negócio também havia sido catequizada por métodos pautados em números e experiências, mas, ainda assim, se mantinha aberta ao diálogo. O diferente era comum e, muito mais importante, era o ingrediente do melhor que cada um poderia proporcionar. Aquelas histórias e práticas inventivas, mágicas ou sofridas só ajudavam as certezas de uma frágil existência, ou ainda melhor, cativavam dúvidas que ficavam cada vez mais concretas.

Dentro da Saraiva, aprendi a amar as diferenças. E não digo de carapuças, porque essas, definitivamente, já no berço aprendi serem voláteis. Refiro-me à arte da dita empatia, tão malograda no uso, no usufruto de uma das ações mais penosas do ser humano. O livro é um objeto genial – lindo, durável, orgânico, rico, fino e, o melhor, acessível.

Essa galera que trabalha com o livro sabe. É uma questão social. Não me venha questionar o rumo capitalista! Temos sustento, mas sem desmerecer profissões, todos sabemos que a escolha da comercialização da sapiência não é vulgar.

Mas vamos lá... prazos cáusticos de recall, didáticos malucos, promoções na ponta do lápis do dia para a noite… e corre para fazer embrulho! Se o leitor não sabe dessas questões – não que seja obrigado a saber, como consumidor –, não fique bravo ao saber que o seu atendente não leu as centenas de romances lançados na semana nem pintou os milhares livros que invadiram as lojas em 2015. Vejo muita crítica aos profissionais da área, sejam eles compradores, promotores, vendedores ou gente do SAC. Todo trabalho tem percalços e se calca no sucesso financeiro. São muitas coisas a melhorar e acho que por isso hoje estou contratado. Percebo muita paixão e criatividade para fazer o livro acontecer. E, muitas vezes, o prêmio é aquela história do leitor. Comovente, bonita e distante das redes sociais. Leitor, o livreiro te ama. Ele está lá por você. E isso importa. Me fez lembrar que essa relação por vezes acaba em casamento, e dá filho, ou junta, já que a lei não legaliza alguns amores. Esse amor tem uma família, com autores que querem filhos prematuros, editores que têm preocupação se o rebento adotado não passear nas lojas...

E ainda tem os promotores… Mesmo trabalhando em uma editora hoje, não tenho muita ideia do que a galera de outra editora faz. Não por ignorar, mas a dança convém a cada dançarino e ao seu ritmo. Aprendi com o Rock que a mensagem deve ser dada. Às vezes, a turbulência ajuda na veracidade, pois se nem conseguimos responder dúvidas simples, como vamos argumentar que caminhamos muitos quilômetros por dia para ver que uma série de calhamaços de papel está vinculada a uma grande rede de varejo que… bom, deixa para lá, por aí vai.

Eu falo apaixonadamente de gente genial que mudou minha vida. Com técnica, primor, plasticidade, narrativa e arte. Isso tudo que desabafo aqui pode ser um texto fora do comum. Inculto, chulo, bobo… Mas se moveu sua curiosidade e arrogantemente te fez feliz ou inteligentemente te fez infeliz, estou satisfeito ou nunca satisfeito ­– como diz a música dos Stones.

Vivo na terra dos mascastes, do forasteiro aprendendo a fazer lei. Nessa terra permaneço, pois é um terreno com frutos, do qual nasci e me misturei. Precisamos de mudanças, mas não venha cuspir no prato que comeu. Pegue sua louça mais bonita de Portugal, com as raízes mais saborosas que os indígenas te deram, e as variáveis africanas e europeias que lhe convir, e vá vender sua comida! Porque é única, arretada, porreta e mágica!

Ah, o título do texto é só uma alusão ao estupendo policial Bom dia, Verônica, de Andrea Killmore... Porque livreiro sempre dá um jeitinho de indicar um livro.

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