Porque não fui à FLIP

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19 de July de 2019

Porque não fui à FLIP

Fernanda Gomes

Este ano não fui à FLIP. Senti falta dos encontros, das ótimas conversas e dos debates sempre interessantes. Mas minha justificativa é boa: Nos dias que antecederam a FLIP, a WIPO (World Intelectual Property Organization) ou OMPI (Organización Mundial de la Propriedad Intelectual, como é mais conhecida por nossos vizinhos), organizou um encontro para discutir a proposta de um tratado de exceções e limitações aos direitos de autor em Santo Domingo, na República Dominicana e eu fui até lá acompanhar de perto e participar.

Acho muito importante poder relatar a experiência, porque a CBL tem um trabalho contínuo e estruturado para o acompanhamento destas questões que nem sempre pode ser divulgado.

A WIPO ou OMPI é uma organização global da ONU criada em 1967 como o objetivo de promover a proteção da propriedade intelectual em todo o mundo e  atua em serviços, políticas, informação e cooperação entre os 192 estados membros e que Brasil faz parte.

Desta forma todos os tratados internacionais relativos à propriedade intelectual, como é o caso dos tratados relativos aos Direitos de Autor, são discutidos, aprovados e implementados no âmbito da OMPI. Já há alguns anos, vem sendo discutidas propostas relativas à limitações e exceções aos direitos autorais.

Quando falamos em exceções ou limitações, estamos nos referindo àqueles casos específicos em que as regras gerais de proteção aos direitos de autor não são aplicáveis ou tem sua aplicação limitada, ou seja, trata dos casos em que os titulares de direitos autorais não podem por força de lei se opor à utilização de sua obra ou exigir remuneração.

Atualmente, já há previsão na nossa lei para alguns casos (elencadas no art. 46 da Lei 9.610/98) estabelecidos de acordo com a Convenção de Berna, da qual o Brasil é signatário. Esta Convenção prevê que cada país poderá estabelecer em suas legislações casos de limitações ou exceções, desde que asseguradas as condições mínimas de proteção das obras e respeitada a regra dos três passos (1.para certos casos especiais, 2. que não cause prejuízo injustificado ao autor, 3. que não prejudique a exploração normal da obra).

Há um bom tempo o assunto tem sido discutido na OMPI, e considera-se a proposta de um tratado com a finalidade de ampliar os casos de exceções e limitações aos direitos autorais. Participam da discussão desta matéria representantes de governos dos países membros da OMPI, o que significa cerca de 90% (noventa por cento) das nações do mundo. Além dos países membros certas organizações podem participar sem direito a voto e também é possível participar como ouvinte.

Como a proposta levanta várias discussões e o tema é bastante polêmico, a OMPI optou por realizar seminários regionais para discutir o assunto. Foram realizados três seminários regionais: o primeiro, na Ásia, aconteceu em Singapura no mês de Abril, o segundo aconteceu na África em Nairobi no mês de junho, e mais recentemente, em Julho, no Caribe, na cidade de Santo Domingo, reunindo países da América Latina e Caribe.

A dinâmica do Seminário foi bem interessante. Na primeira seção, especialistas convidados pela Ompi apresentaram seus estudos sobre a matéria, na sequência, os países foram divididos em três grupos: Grupo1 (Argentina, Costa Rica, Republica Dominicana, El Salvador, Guatemala Honduras, México, Nicaragua), Grupo 2 (Antigua e Barbuda, Bahamas, Barbados, Haiti, Jamaica, Suriname, Trinidad e Tobago e alguns outros),   Grupo 3 (Brasil, Colombia, Chile, Equador, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela)

Cada representante de país (estado membro) foi encaminhado para as salas definidas conforme os grupos, sentaram-se à mesa juntos para relatar como as limitações e exceções estão previstas nas legislações locais e outros pontos considerados importantes. Nesta oportunidade, os ouvintes presentes (meu caso), podiam sentar-se próximos à mesa, fazer perguntas e apresentar considerações, conforme fosse autorizado pelo presidente de cada mesa.

Como ouvintes haviam representantes da IPA (Internacional Publishers Association), IFRRO (Internacional Federation of Reproduction Rights Organization), IFLA (Internacional Federation of Library Associations and Institutions), e vários representantes de Câmaras de Livros e Associações de editores da América Latina e Caribe.

Considerando a quantidade de participantes, a diversidade de países e as várias representações de seguimentos, surgiram os mais diversos posicionamentos sobre a necessidade ou não de um tratado e sobre eventual ampliação das limitações e exceções aos direitos de autor. Foram levantadas questões do ponto de vista de editores, livreiros, bibliotecários, museólogos, autores e da sociedade.

Foram duas sessões de amplas discussões, em alguns momentos bem acaloradas e em outros com um tom mais conciliatório. Na última sessão, que aconteceu na parte da tarde do segundo dia, todos foram novamente reunidos em um único espaço. O representante de cada grupo do Estados membros apresentaram as impressões e observações coletadas. Em linhas gerais, percebeu-se que boa parte dos países já possuem algum nível de exceções e limitações em suas leis locais, que alguns deles consideram importante a inclusão de algumas exceções e outros entendem já estarem adequados ou possuir condições para adequar suas leis.

Considerando a diversidade de realidades e casos específicos, parece muito mais adequado que cada país avalie as suas realidades e necessidades locais, e se for o caso,  implementem em legislações próprias. Nenhum dos grupos foi conclusivo quanto à necessidade de um tratado.

O resultado final de tudo isso, só poderá ser visto em Outubro, quando todos os países membros se reunirão em Genebra, onde fica a sede da OMPI para dar seguimento a este trabalho. Enquanto outubro não chega, devemos trabalhar na consulta pública que está aberta para apresentação de sugestões. A CBL deve nos próximos dias convocar uma reunião do Fórum pelos Direitos Autorais para trabalhar na proposta.

 

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